sexta-feira, 3 de março de 2017

ATIVIDADE PARA BERÇÁRIO - CESTINHAS SURPRESA

Regularidade e diversidade: componentes fundamentais no planejamento de atividades para bebês


Em um um berçário as crianças devem explorar com segurança o mundo que as cerca, interagir com adultos e entre elas, brincar, transformar, aprender a se comunicar, ir conquistando maior independência. A diversidade de experiências amplia as possibilidades de um desenvolvimento pleno e da participação ativa nos desafios que o dia-a-dia impõe.
Foi nesta perspectiva que iniciei um trabalho com crianças das creches Papa João XXIII e Dom José Gaspar, ambas integrantes do Programa Capacitar Educadores, de São Paulo1. Meu trabalho consistia em uma intervenção de duas horas com as crianças, seguidas de uma hora de discussão com as professoras, que observavam atentamente minha prática.

Para que fosse possível refinar o olhar sobre os bebês e aprofundar o conhecimento nesta faixa etária, adotamos a divisão dos grupos como uma importante estratégia de trabalho para melhor atender às individualidades das crianças e as especificidades de cada proposta. Enquanto as crianças de 4 meses a 1 ano e meio participavam das atividades com as cestas, as maiores, de até 2 anos, participavam de atividades de pintura.
Nesta matéria, no entanto, vou contar a experiência realizada com os bebês de 4 a 11 meses.
Uma proposta interessante para bebês

A proposta para os bebês consistiu em apresentar cestinhas de plástico, potes ou caixas dentro dos quais se encontravam objetos variados, provocando a curiosidade deles. Escolhi objetos industrializados e outros confeccionados na própria creche, procurando atender à necessidade de exploração sensório- motora das crianças.
Ao abrir as cestinhas e caixinhas, elas encontravam objetos variados: chocalhos; caixinhas de papelão forradas com imagens diversas; pedaços de conduíte; apitos variados; retalhos de tecido; espelhinhos; objetos de borracha para sugar e morder de diferentes formas, cores e tamanhos; bexigas cheias de água; luvas cirúrgicas cheias de algodão, água ou sagu; plumas; tocos e bastões de madeira; tamborzinhos confeccionados com sucata; argolas; piões de plástico coloridos; e outros.
O principal objetivo dessa atividade era criar contextos de exploração e interação nos quais as crianças, como participantes ativas, tivessem oportunidades de aprimorar seus comportamentos comunicativos, construir competências de natureza motora, afetiva e cognitiva.
A atividade com as cestinhas desafia os bebês a imitar gestos e ações, a escolher um objeto, descobrir jeitos de explorar e interagir no grupo.Todas essas situações demandam a ativação e a coordenação de esquemas para diversos fins, favorecendo, portanto, o desenvolvimento.
Além disso, para a criança pequena é uma atividade repleta de sentido, visto que a própria exploração é fonte de prazer: seu interesse está todo voltado às suas experiências sensório-motoras desencadeadas pelas ações sobre os objetos, que possibilitam a descoberta, o conhecimento.
Além de interagir com o meio físico, a criança pode se envolver em ações conjuntas que estimulam a comunicação e a construção de novos significados, na companhia de um adulto atento e envolvido para investir nessas trocas e apoiar as construções individuais e coletivas.
A surpresa do primeiro dia

As educadoras ficaram responsáveis por organizar o espaço do berçário: arrumaram o tapete e as almofadas para que pudéssemos acomodar os bebês em roda. Assim, em um ambiente mais confortável para todos, apresentei ao grupo, pela primeira vez, as cestinhas que havia levado. Numa atmosfera de surpresa que transparecia nos olhares das crianças, fui tirando objeto por objeto, nomeando, mostrando algumas possibilidades de exploração e conversando com o grupo.
As crianças me observaram por alguns minutos e depois, aos poucos, foram se aproximando para olhar de perto e tentar tocar os objetos. Distribui uma cestinha para cada bebê. Para os que ainda não ficavam sentados, oferecíamos um objeto de cada vez.
Curiosos, iam rapidamente pegando, observando, mordendo. Alguns chegavam a puxar também a cestinha do outro para olhar o que tinha dentro e, em poucos minutos, todos os objetos já estavam misturados pelo chão. Não observei nenhuma situação de conflito entre as crianças por causa dos brinquedos.
Continuei explorando os objetos das mais diversas formas (A), colocando-me como parceira na brincadeira, alguém que os bebês podiam observar. Algumas crianças me imitavam, outras permaneciam entretidas com sua própria cestinha.
Depois de um tempo, fui propondo brincadeiras de rolar e jogar bolas e chocalhos, girar argolas pelo chão, passar minha bola dentro da argola de um, brincar de puxar e soltar a argola de outro. Os bebês facilmente interagiam comigo, repetindo os gestos e me imitando (B).
Logo começaram a me “sugerir” brincadeiras: jogavam a bola para mim, se aproximavam e me ofereciam algum de seus objetos. Observei que algumas crianças tentavam fazer o mesmo com as outras, que ora respondiam, ora continuavam entretidas em seu próprio “jogo”.
Permaneceram ali no tapete entretidas com a cestinha de surpresas por aproximadamente trinta minutos, até a hora do jantar. Não finalizei a atividade, já que elas poderiam continuar brincando enquanto as educadoras volantes preparavam e davam o jantar aos seus companheiros; desse modo, todos se ocuparam com algo interessante enquanto esperavam sua vez de se alimentar.

Mesmos objetos, novas explorações


Durante as semanas seguintes, as educadoras da sala continuaram a propor as brincadeiras com as cestinhas, acompanhando as crianças, provocando diferentes interações, dando continuidade à proposta nos demais dias.
Nesses momentos, um mesmo comportamento se repetia: quando as crianças me viam chegar com aquela pilha de cestas, ficavam eufóricas (C), se aproximavam de mim, sorriam, davam gritinhos, arregalavam os olhos e balançavam os bracinhos, demonstrando saber que ali havia algo que lhes interessava. Era encantador observá-las, podíamos esquecer todos os problemas ao presenciar a beleza da descoberta nessa situação de exploração.
Dias depois, quando voltei, as crianças já estavam bem familiarizadas com os objetos. Então passamos a reapresentá-los de diferentes maneiras, provocando e desafiando-as nas interações com os materiais.
Uma vez distribui as cestas e fiquei com uma e, enquanto as crianças exploravam, contei uma versão da história “Os três cabritinhos”, utilizando os objetos como personagens. Elas brincavam e me observavam ao mesmo tempo. As que não estavam interessadas em mim, só voltavam o olhar quando eu fazia algum barulho; então paravam de brincar para me escutar contando. Percebi que várias tentavam me imitar, batendo com os tocos de madeira nas forminhas a fim de tirar som delas.
Em um outro dia, provoquei-as colocando somente um tipo de objeto em cada cesta (D). Ao distribuir, foi visível a curiosidade de umas pelas cestas das outras, como se estivessem perguntando: “O que tem na sua cesta?” Em poucos segundos os objetos já estavam todos misturados.
Mesmo tendo distribuído uma cesta para cada criança, com um tipo de objeto diferente em cada uma delas, não houve nenhuma espécie de disputa ou briga: os bebês compartilharam os brinquedos com grande prazer. Acredito que seja o prazer por relacionar-se e por explorar e conhecer o universo a sua volta que faz a convivência tão pacífica e divertida.
Essa grande circulação dos objetos nos levou a pensar em alguns cuidados. Embora os objetos sejam distribuídos em quantidade suficiente para todas as crianças, eles se misturam – e é importante que isso aconteça, pois é resultado da interação entre as crianças –, o que exige atenção especial quanto à higiene desses brinquedos.
Mesmo guardados em sacos, acabam sujando com o uso e a poeira do ambiente; além disso, ao passar os objetos de uma criança para a outra há sempre o risco de contaminação. Antes de usá-los novamente com as crianças, é preciso lavá-los e secá-los.
O surgimento de preferências

Aos poucos fomos percebendo que as crianças tinham preferências: a bexiga d’água foi alvo de muitos apertões e mordidas, tanto que uma acabou estourando e molhando algumas. Motivo de surpresa e risos para quem se molhou. O chocalho feito de pote de filme fotográfico e as argolas, apesar de velhos conhecidos, fizeram grande sucesso. Rapidamente se espalharam pelas mãos e bocas de várias crianças.
Como já estavam bastante familiarizados com os objetos da cesta, começamos a incluir algumas novidades.(E) Na roda, mostrei primeiro os objetos conhecidos e depois as novidades. Umas caixinhas forradas com papel reciclado em cujas faces colamos imagens variadas em miniatura. Também variamos o peso e as possibilidades de produção de sons diversos das caixinhas contendo sementes e pedrinhas. Além delas colocamos também pedaços de conduíte, que permitiam diferentes formas de exploração: morder, torcer, olhar por dentro como se fosse um binóculo, soprar como se fosse uma pequena corneta.

Mais uma vez distribuí as cestinhas, observei a interação das crianças e as preferências e sugeri possibilidades de “jogar” 
(F) com os objetos pelos quais elas mais se interessavam. Outras crianças se aproximavam, observavam durante um tempo, procuravam objetos iguais e logo davam um jeito de demonstrar que queriam participar, com um sorriso, imitando e oferecendo o que tinham em suas mãos.
Olhar para o grupo, e olhar para o indivíduo

É importante que o professor se deixe encantar pelo universo da criança, pois é deste lugar que irá conseguir uma comunicação efetiva com ela. No período sensório-motor, à falta da linguagem oral, o corpo todo da criança brinca, fala. É uma forma de comunicação que devemos reaprender para compreender e sermos compreendidos.
Gestos, movimentos, afagos, olhares, expressões, todos são formas de expressão e juntos culminam na linguagem característica dos pequenos, em algo que compreendem. Vale ressaltar que nem todos se comunicam da mesma forma. Assim como temos nossas peculiaridades, nosso “jeito” que nos dá identidade, as crianças também. E é com essas singularidades que devemos aprender a dialogar, por isso a observação é tão importante, sempre.
Minha experiência com os bebês mais uma vez confirmou isso. Lara, por exemplo, olhava curiosa para mim e para as cestinhas, como todos os outros faziam, mas, além disso, também ria, balançava as perninhas, esticava os braços e abria e fechava os dedinhos como se pedisse para eu lhe entregar logo sua cesta.
Lara, Eshley e Mariana rapidamente perceberam que com caixinhas era possível produzir sons. Uma balançava, as outras imitavam e assim ficaram jogando durante um tempo e marcando seus ritmos ao mesmo tempo em que riam umas para as outras. Lara pegou uma caixinha vazia, balançou com força e, percebendo que não fazia som, foi em busca de outra (G).
Vinícius também me chamou a atenção: ele chorava com freqüência e raramente era motivado a brincar ou explorar. No último encontro fiquei com ele no colo durante um longo tempo. Enquanto as outras crianças brincavam, eu conversava com ele, cantava e tentava motivá-lo a brincar comigo. Cheguei a comentar com Denise, sua educadora, o quanto é importante lhe dar uma atenção especial. Mas naquele dia Vinícius sorriu para mim e pela primeira vez demonstrou interesse pelos brinquedos e até participou de uma brincadeira que propus.
Samira brincava com uma bola, jogava e pegava de volta. Peguei a bola e joguei novamente para ela. Gabriel, Rian e Vinícius ficaram interessados, então sugeri que jogassem a bola um para o outro, mas eles devolviam para mim, sorrindo. Apenas Gabriel a jogou para os outros pegarem.
Igor recebeu a caixinha com a mesma alegria de sempre, muito sorridente, fazendo um esforço enorme para se comunicar apesar de todas as suas dificuldades. Sempre usava parte do tempo para lhe dar uma atenção exclusiva, pois dependia muito da ajuda do professor para conseguir segurar os objetos e interagir. Como ele ainda não tem essa autonomia, precisa de auxílio, do contrário passa todo o tempo somente observando. Entreguei-lhe a bola, ele não quis, recusou também a caixinha, mas ficou interessado pelo conduíte, que agarrou e manteve na boca por longo tempo.
Mariana, depois de ter explorado bastante todos os objetos, brigou com seu colega por causa das cestinhas, queria pegar várias e empilhá-las, repetindo a brincadeira favorita das crianças.
Nesse dia também observei a primeira situação de conflito, que desde então apareceu com mais freqüência em todos os grupos. Conflitos saudáveis, que permitem às crianças perceberem a existência do outro. Essa integração entre crianças provoca a aparição dos conflitos e possibilita a socialização, as aprendizagens e um desenvolvimento mais enriquecedor.
Viver em grupo também é novidade

A intervenção não deve prescindir de uma observação cuidadosa. O olhar atento para a criança e suas ações é fundamental para se fazer intervenções adequadas. As investigações das crianças e seu investimento nas diferentes maneiras de exploração dos objetos devem ser observados constantemente pelo educador, assim como as formas de comunicação que se estabelecem durante a atividade. O professor deve compreendê-las, aproximar-se de seu universo para poder com elas interagir e trocar.
A observação permite essa aproximação e a compreensão das necessidades e desejos dos pequenos e, a partir dela, o professor pode intervir e planejar suas ações com mais segurança.
Por isso me preocupava em observá-las e ajudar as educadoras da turma na mesma tarefa. Isso nos levou a pensar sobre as crianças e seus jeitos de interagir e nos ajudou a descobrir melhores formas de intervir junto a elas. As crianças menores, por exemplo, não interagem umas com as outras, a não ser por meio de longas e atentas observações.
Todos os objetos vão à boca, modo fundamental de explorarem e conhecerem aquilo que está a sua volta. Brincam com os objetos que estão ao seu alcance, a sua vista, não saem em busca do que já conhecem e está escondido, como fazem os maiores. Como são menos autônomas, necessitam mais da atenção e intervenção do professor para que realizem ações diversas.
As diferenças entre as faixas etárias ficaram muito visíveis com essa organização do grupo. Explicitou-se a necessidade de ações e intervenções diferenciadas por parte do professor, o que também se mostrou bastante interessante, visto que os pequenos podem aprender muito com os mais velhos.
Regularidade e diversidade nas propostas 

Também descobrimos que é muito importante manter uma certa regularidade nas atividades com os pequenos, pois para se apropriarem do que estão aprendendo, eles precisam repetir muitas vezes.
Por isso, fizemos questão de manter o modo de apresentação da atividade, como um ritual: em tom de surpresa, eu retirava os objetos de minha cesta, um a um, e mostrava às crianças. Depois de apresentar todos, guardava-os de volta e distribuía uma cesta para cada criança, instigando-as com a pergunta:
Vamos ver o que tem na cesta de vocês? Será que tem as mesmas coisas que tem na minha?
Muitos não agüentavam esperar, inclinavam o corpo, olhavam curiosos e esticavam os braços para pegar os objetos da cesta do colega ao lado.
Com o tempo, nem era mais preciso chamar as crianças para se aproximarem da roda: ao verem as caixinhas engatinhavam, andavam e sentavam-se perto de mim. Então, era só ajudá-las a se organizar, de modo que todas pudessem me ver e ao mesmo tempo enxergar umas às outras.

A mudança ficava por conta dos objetos novos que acrescentávamos às cestas a cada semana. Um dia pus espelhinhos pequenos–me certifiquei de que não se quebravam facilmente e estavam firmemente presos às molduras – e algumas penas grandes coloridas. Depois de pegar, observar e “experimentar” os diversos objetos, é comum cada criança eleger alguns desses objetos para repetir ações e explorar com mais afinco, com mais “profundidade”.
Mariana, por exemplo, passou muito tempo enfiando as penas nos buracos da cesta e, percebendo que elas ficavam eretas, foi montando uma “escultura”. Lara e Sâmara, entretidas com as caixinhas de imagens, chacoalhavam e batiam umas nas outras para fazer barulho.
Sâmara se dirigiu até o espelho e repetiu os gestos com as caixinhas enquanto se mirava (H). Lara a seguiu, sentou-se ao seu lado e se pôs a empilhar as caixinhas sobre a cesta virada de cabeça para baixo. Sâmara, vendo-a pelo espelho, levou suas caixinhas e colocou sobre as de Lara.
Rian se divertia colocando as penas na cabeça. Antônia, uma das educadoras da turma, mostrou-lhe a imagem dele no espelhinho e ele repetiu a ação diversas vezes. Depois colocou e tirou a própria cesta da cabeça, achando graça no jogo de esconder. Igor, no colo da educadora, ria a valer.
Eshley tirava todos os objetos da cesta e, em seguida, guardava-os todos de volta novamente.Vinícius pegou todas as cestas que conseguiu e empilhou-as. Só não conseguiu se apossar da de Mariana, que esbravejou, arrancando-a de suas mãos. Percebendo que o colega estava com muitas cestas, decidiu que queria brincar com elas também e começaram a disputar. Mais uma vez o conflito apareceu e gerou novas interações. Intervi propondo que fizéssemos uma grande torre, todos juntos. Construímos e destruímos a torre algumas vezes, até que se cansaram e saíram à procura de outras coisas.
Encerrei a atividade propondo que as crianças me auxiliassem a guardar o material nas cestas, tarefa difícil e demorada. Depois foram brincar no pátio.
Possibilidades em aberto

Essa atividade que trazia ora a regularidade, ora a diversidade, criou momentos preciosos de interação no grupo e gerou muitos desdobramentos, como, por exemplo:
  • a pesquisa sobre novas combinações de objetos e ações, criando novos sentidos para as mesmas coisas;
  • a criação de cantos com os objetos das cestas, que puderam ser explorados com autonomia, tematizados por tipo de ação que sugerem ou por atividade sensório-motora envolvida;
  • a criação de propostas de atividades utilizando somente os objetos da mesma natureza, por exemplo, sonoros, de assoprar etc.;
  • instalações na sala das crianças com os objetos das cestas.
O que aprendemos com a atividade

Essa seqüência se mostrou extremamente interessante para os bebês, sob vários aspectos. Do ponto de vista da criança, foi possível observar que as atividades foram extremamente prazerosas, visto que o envolvimento e a participação das mesmas foram intensos.
Podemos atribuir esse interesse ao significado da exploração: para os pequenos, explorar é uma atividade prazerosa por si só, independentemente de seus resultados. Da perspectiva do desenvolvimento, essas experiências estimulam a ativação e a articulação de esquemas diversos para resolver situações diferentes.
A imitação e a exploração abrem possibilidades de descoberta e de aprendizagem pela criança, que aprende por meio de suas próprias ações. Explorando, os bebês podem conhecer, descobrir, articular suas competências sensório-motoras para criar novas possibilidades de ação e ter mais autonomia.
Ao propor desafios interessantes, o educador cria para os bebês oportunidades de aprender e favorece, dessa forma, seu desenvolvimento. Ao mesmo tempo, esse formato de atividade propicia a integração do grupo, favorecendo a interação das crianças, o que ajuda no desenvolvimento das competências comunicativas e da socialização, além de contribuir com as aprendizagens, já que o professor não é — e não deve ser — a única fonte de inspiração para a criança.
Ao observar, imitar e interagir com os colegas, os pequenos também aprendem e se desenvolvem. Porém, é essencial que tenhamos claro que, para as atividades serem de fato prazerosas e significativas para as crianças e colaborarem para seu desenvolvimento, são necessárias algumas condições. É fundamental:
  • conhecer a criança com a qual se trabalha; saber planejar considerando suas características e necessidades;
  • saber intervir;
  • saber se relacionar com as crianças;
  • criar um ambiente favorável para a realização das atividades.
Atento a esses cuidados, o educador pode investigar, experimentar novos jeitos de encaminhar as atividades e observar suas vantagens e desvantagens. E, ao final, se surpreender e se encantar com os progressos dos pequenos.
(Ana Lúcia Bresciane, Psicóloga, formadora do Instituto Avisa Lá)

Comentários do Professor Lino de Macedo:
(A) A ação da professora sobre os objetos estimula a da criança, sem ela talvez não haja muita brincadeira. A ação do adulto amplia o repertório, mostra que é possível brincar de diferentes jeitos.A criança reconhece as possibilidades e reproduz do jeito dela e com as variações ao seu gosto, repetindo o que mais gosta. A questão do possível tem a ver com repertório, porque há crianças com pouco repertório, principalmente aquelas pouco estimuladas, com escassez de objetos em casa.
(B) Segundo Piaget, uma das características principais dos bebês de 8 meses a aproximadamente 1 ano é a coordenação de esquemas secundários, o que possibilita que a criança utilize um meio para outros fins. Por exemplo, nessa atividade cestinha e chocalho são coisas independentes. Só neste contexto criado pela professora eles são interdependentes. Uma coisa é uma cesta e os objetos que ela contém e outra coisa é usar os objetos que estão dentro da cesta, principalmente se forem variados.
Os meios e os fins se coordenam, mas não no sentido de um ser prolongamento do outro, mas são diferenciados e acabam se integrando pela ação da professora e da criança.
(c) Outra característica dessa fase é o que Piaget chama de indícios, que prenuncia o aparecimento da inteligência simbólica. Indício é associação. Podemos notá-lo nos famosos exemplos em que a criança escuta a mãe preparando a mamadeira e já pára de chorar porque sabe que vai mamar, ou ouve o barulho de chave e já olha para a porta porque sabe que o pai está chegando.
O gesto exploratório feito pela professora – ao apresentar os objetos às crianças – funcionou como indício para o gesto exploratório da criança. É um fenômeno inteligente e dialético reconhecer o gesto para poder reproduzi-lo.
(D) O interessante da atividade também é a surpresa no sentido daquilo que está em suspenso, o desconhecido. Daquilo que eu não antecipo porque não existe de antemão nenhum indício. A professora ao perguntar o que tem dentro da caixinha e ao explorar fornece os primeiros indícios.
A atividade causou surpresa, causar no sentido de desencadear. Quais foram os desencadeadores de surpresa? A própria caixinha, o fato de ela ser tampada ou não, de ter composições diferentes e também as macaquices da professora. Essas ações ajudaram a criar vínculo com o objeto. A ênfase é no como fazer no procedimental. O esquema é presentativo. Como é que eu presentifico alguma coisa?
(E) Surpresa tem a ver com aquilo que a pessoa não controla, não antecipa. Eu nunca imaginei que pudesse fazer isso com uma argola – como se uma criança dissesse para si mesma.A surpresa é um termo conveniente, para essa atividade. Se a criança não tem esquema para assimilar, ela nem vê a novidade. O papel do educador é criar atividades e brincadeiras que surpreendam, mas que sejam assimiláveis pelas crianças. Isto é, tenham ressonância com seus esquemas.
O que surpreendeu as crianças nessa seqüência de atividades? O fato de a caixinha parcialmente esconder os brinquedos, as variedades dos brinquedos que estavam dentro? As ações que a professora fez ou as outras crianças fizeram? A criança se surpreende brincando, estimulada pelo adulto e também descobrindo um jeito novo de se relacionar com os objetos.
Algumas ações rotineiras são reapresentadas e não deixam de surpreender. São muitas as perguntas que as crianças podem se fazer. Será que hoje tem a mesma coisa de ontem? Será que tem alguma coisa diferente hoje? Com os mesmos objetos, que coisas diferentes a minha professora vai fazer? É por isso que um mesmo objeto distrai a criança durante tanto tempo.
(F) Piaget fala da importância de promover o desenvolvimento. A reação à proposta feita pelo adulto depende do nível da criança, ou seja, o mesmo gesto para algumas crianças promove uma coisa e para outras promove outras coisas. As ações da professora ao explorar os objetos, fingir que morde, balançar etc., funcionam como sugestão para a criança que pode assimilar. A isso que Piaget chama de desencadear. O desencadear tem dois destinos: a indução ou a espontaneidade.
A indução é quando a criança fica restrita ao modelo e só brinca desse jeito quando o modelo estiver presente estimulando, quer dizer, ela não inventa nada, não adapta, não ajusta, não cria, não dá sinais de uma apropriação pessoal; então é alguém que copia. Isso não é negativo, pois significa um reconhecimento, uma identificação, porém a criança depende do modelo todo o tempo.

O trabalho com as caixinhas provocou tanto a indução como o espontâneo. Estimulou a criação, favoreceu a curiosidade: Será que na sua caixinha tem o mesmo que na minha? O bebê observou que os objetos nem sempre eram os mesmos e ficou curioso. Percebeu a “lei de composição das cestinhas”, e isso é superinteligente. A criança observou que as caixas não eram iguais. Isso é um indicador do que Piaget chama de espontâneo. O espontâneo está além daquilo que o professor ensina.
(G) Uma característica do 5º estágio da inteligência sensório-motora é o que Piaget chama de experimentos para ver. É aquela famosa fase em que, por exemplo, a criança joga mil vezes um brinquedo no chão, é o prenúncio do espírito investigativo.Até o 4º estágio o objetivo da ação é o processo. Eu jogo pelo jogar, para estudar o jogar, e é isso que caracteriza a curiosidade. Já nas experiências para ver se desencadeia maior exploração, quer dizer vamos “namorar” os objetos, os sons, as texturas, o gosto. É um tipo de prazer.
O que é isto que tenho nas mãos? Eu ponho na boca ou não? É gostoso? O que a outra criança está fazendo com o mesmo objeto? Toda essa atividade exploratória é muito característica do 5º estágio. São perguntas de quem pesquisa. Este objeto é mais legal de ouvir o barulho ou de morder?
(H) As crianças observam e copiam os amigos. Em um berçário bem organizado e planejado há uma verdadeira oficina de criação. Criação no sentido de explorar. Não é só explorar objetos, é explorar as próprias atividades e esquemas e descobrir ações novas para outros fins. Posso bater um objeto para explorar seu som ou para desengatar uma peça. Isso é importante do ponto de vista do desenvolvimento da criança. Por que assim eu aprendo sobre as características dos objetos: força, densidade, massa, tamanho, textura, volume, cor, função.
Este fascínio por esconder e achar também funciona na atividade da caixa. Esconder e achar traz a idéia do simbólico. O símbolo ocupa o lugar do invisível, do ausente, daquilo que só pode ser parcial. Enquanto a criança pequena não tem recursos simbólicos, é fundamental a exploração. Nessas milhares de ações sobre os objetos, pegar, olhar, morder, rolar, que esse agregado vai se montando e me dando algo que na ausência do símbolo me faz ter uma certa noção de identidade.

Dicas de Planejamento

Embora pareça uma ideia simples, a oferta de caixas e cestas com objetos surpresa para bebês pode ser melhor aproveitada quando o educador planeja de acordo com as possibilidades reais das crianças, suas características, interesses e necessidades. Organizar previamente materiais e espaços é tão importante quanto orientar a atividade adequadamente.
Organização dos materiais
Os objetos devem ser escolhidos segundo alguns critérios. A princípio devem ser bonitos, interessantes e instigar a curiosidade da criança. Portanto, ao confeccioná-los ou comprá-los, leve em consideração esses fatores. Devem possibilitar experiências sensório-motoras diversas: auditivas, táteis, visuais, gustativas etc. Deve ser possível estabelecer relações entre os objetos ofertados; é interessante, por exemplo, oferecer objetos vazados juntamente com outros que possam atravessá-los, pois possibilitam experiências cognitivas.
É necessário levar em consideração o fator segurança: os objetos não devem oferecer riscos aos bebês, portanto é importante testá-los antes. Existem objetos muito interessantes à exploração, mas que necessitam de um olhar atento e constante, além da supervisão do adulto.
O cuidado com os materiais não deve se restringir ao momento da atividade. É necessária a limpeza dos mesmos a cada utilização para evitar riscos de contaminação, como também devem ser guardados em lugares limpos e seguros.
Organização do espaço 

Antes de realizar a atividade é importante o educador pensar em como irá organizar o espaço.O ambiente deve ser aconchegante, confortável, contentor, no sentido de que “contém” o grupo, não deixa ninguém de fora, não dispersa as pessoas, criando condições ideais para oportunizar trocas, propício para observação e exploração intensas, que permita mobilidade das crianças e do professor, que favoreça a observação e a comunicação entre os participantes.
Orientações para a atividade

É importante garantir elementos que se repetem nas atividades, isso é bom para as crianças. Manter o mesmo formato de proposta, de apresentação dos objetos cria um sentimento de segurança nas crianças, além de favorecer a participação das mesmas, pois sabem o que vai acontecer. Quando propomos algo diferente a cada dia, a criança não tem como saber se aquilo a agrada ou não, além de não ter a oportunidade de se apropriar dos conhecimentos envolvidos.
O mesmo vale para os objetos. O elemento surpresa é importante, mas isso não significa que a cada atividade devemos oferecer coisas diferentes. É fundamental que possam ter experiências repetidas e diferentes com os mesmos objetos. Dessa forma, é mais interessante fazer rodízios e ir substituindo objetos conhecidos por novidades aos poucos.
Conversar com os bebês é uma importante orientação deste trabalho.O fato de eles não falarem não significa que não nos entendem; pelo contrário, é muito importante quebrar o silêncio no berçário. Uma fala clara, não infantilizada, permite que a criança também se aproxime do universo adulto, de nossa forma convencional de comunicação oral.
Conversar com bebês é fundamental para que possam compreender a fala do adulto e se apropriar dela. As crianças aprendem a partir de referências, modelos. Os professores são por excelência referência e modelo para elas, bem como os seus companheiros.
Por isso, é importante que se dê sugestões para as crianças do que se pode fazer com os objetos, de como brincar com eles. As que já podem assimilar as ações do professor como sugestão irão tentar imitá-lo, poderão experimentar as mesmas ações, até se apropriar delas. Essas mesmas ações, apropriadas, poderão ser generalizadas e utilizadas agora para diversos fins, e podem também desencadear novas ações pelas crianças, o que favorece o desenvolvimento.
Como já foi dito, depois de se apropriar de certos saberes a criança é capaz de criar outras ações. Seus fazeres não se limitam às imitações, mas desencadeiam outros atos, que devem ser apreciados pelo professor. É interessante que este, diante de uma experiência diferente da criança, uma exploração nova, procure atuar conjuntamente com ela, no sentido de valorizar suas construções e dar continuidade a elas, para que com sua ajuda a criança possa superá-las, ir além. Enriquecer as experiências infantis, bem como estimular as trocas entre as crianças e favorecer sua curiosidade, é tarefa da qual o professor não pode se eximir.

Ficha técnica:

Iniciativa: Instituto C&A
Desenvolvimento: Instituto Avisa Lá, Creche Dom José Gaspar e CEI Papa João XXIII.
Equipe: Ana Lucia Antunes Bresciane, Rosemeire Rodrigues, Suzana Pereira de Souza, Luciana Rabelo Isaías, Solange da Paixão Santana Menegatti, Denise Barbosa Pires de Oliveira, Antonia Nalubia Galdino.
  • CEI Municipal Papa João XXIII – Rua Frei Claude D’Alberville, 432 – Jardim João XXIII, CEP 05569-010 – Tel.: (11) 3782-1829. e-mail: ceipapajoao@ig.com.br Site:www.ccsn.org.br – Coordenadora Pedagógica: Solange Santana Menegatti – Diretora: Roseli Machado da Silva
  • Creche Dom José Gaspar – Rua Áurea Batista dos Santos, 703 – Vila Morse CEP 05623-000 – SP Tel.: (11) 3742-7625 e-mail: rrosemeire@ig.com.br vilamorse@hipernet.com.br -Coordenadora Pedagógica: Rosemeire Rodrigues -Diretora: Elizabeth Pinheiro W. Elias


* FONTE: http://avisala.org.br/index.php/assunto/reflexoes-do-professor/cestinhas-surpresa/

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