quarta-feira, 27 de junho de 2012

DESENHO: EXPRESSÃO DE LINHA E MOVIMENTO


Vemos que quando brinca, a criança traça linhas e deixa suas marcas no espaço, expressando as diferentes maneiras como olha e compreende o mundo. Portanto, observar as linhas, pesquisar sua movimentação é parte do trabalho do desenho.
Mas, a atividade de desenhar envolve mais do que colocar uma ideia no papel. Muitas vezes, a ideia surge ao desenhar, vem da observação dos traços, da movimentação, da expressão gestual. Essa é a perspectiva que encontramos na proposta elaborada pela professora Flávia Kioko Alexandre Ito. Vamos ver como Flavia pensa no desenvolvimento corporal das crianças em relação às experiências de desenhar.
Ao registrar a pesquisa de materiais gráficos e suportes inusitados, uma atividade realizada com seu grupo, a professora Flavia relatou o seguinte: “Primeiramente, organizei na mesa alguns materiais e suportes: sulfite, cartolinas, colorset, laminado, papelão ondulado, papel cartão (diversas cores), revistas, lápis de cor, giz de cera e canetinhas.
Conversei com as crianças, explicando que poderiam escolher o tipo de papel, o tipo de lápis para fazer o desenho e que poderiam desenhar como quisessem. Em grupos, elas se deslocavam até a mesa para escolher os materiais. Ao pegar papel de cor preta, experimentavam as cores que podiam ser boas para desenhar sobre preto: muitas já sabiam que o lápis e o giz branco produzem riscos mais fortes, que aparecem mais. Então, experimentavam as possibilidades desses materiais, explorando maneiras de usá-los, investigando como esses materiais riscam os suportes, trocando informações com os outros colegas.”
Nesse registro, percebemos que a partir do que foi preparado pela professora, as crianças tiveram possibilidades de escolher como gostariam de desenhar. E como a professora poderia contribuir para os avanços nessa produção? Ao observar o que foi desenvolvido pelas crianças, o que já sabiam e o que buscavam descobrir, a professora Flávia procurou registrar essas experiências e planejar a continuidade da sequência das atividades.
Sua intenção era apontar caminhos para cultivar o desenho das crianças, proporcionando-lhes experiências visuais transformadoras. A seguir, acompanhamos um pouco desse processo de construção do planejamento
da professora Flavia. Ela nos contou: “Na primeira vez que ofereci esses materiais, muitas crianças desenharam sentadas em suas cadeiras, utilizando as mesas para apoiar o papel. Outras descobriram novas soluções corporais: em pé, de joelhos utilizando a cadeira como apoio. Num outro dia, ofereci os mesmos materiais e sugeri que desenhassem sentadas no chão. Elas acharam meu pedido estranho, mas eu expliquei a elas que desenharíamos para experimentar. Foi muito interessante, pois observei que até mesmo para desenhar, a expressividade corporal se faz presente.”
No fragmento abaixo podemos ver como a professora Flávia continua propondo desafios e problemas a seu grupo e aponta, ainda, a dimensão lúdica ligada à experiência. Ela nos conta: “organizamos alguns materiais na mesa e prendemos cartolinas na lousa para que desenhassem ali mesmo. Conversamos como poderíamos desenhar de um modo diferente, por exemplo: como desenharíamos sem usar as mãos? O que poderíamos utilizar para realizar os desenhos? As crianças responderam que poderíamos utilizar a boca, os pés e a cabeça. Eles se divertiam muito, como se fosse uma brincadeira, um jogo”.
Chama a atenção a forma como a professora construiu relações entre as experiências com a expressividade das linguagens artísticas, com foco no desenho, e as experiências de exploração da linguagem corporal visando promover possibilidades do gesto do desenho.
Os registros dessa professora podem ser inspiradores para outros professores na medida em que relatam como é possível explorar a linguagem do desenho de crianças pequenas e sua relação com outras linguagens. Mostra como se cria condições para esse processo de construção de sentidos, enriquecendo um espaço mais criativo para o surgimento das narrativas infantis.



“As pessoas sem imaginação podem ter tido as mais imprevisíveis aventuras, podem ter visitado as terras mais estranhas... Nada lhes ficou. Nada lhes sobrou. Uma vida não basta ser vivida: também precisa ser sonhada .”
Mário Quintana, em Caderno H.20 Cadernos da Rede


*texto de: Cinthia S. Manzano

terça-feira, 26 de junho de 2012

DICA LITERÁRIA


HORA DO ALMOÇO
BRENMAN, ILAN
CIA. DAS LETRINHAS


SINOPSE: 
Todos aqueles que convivem com crianças sabem da dificuldade que é a hora de comer: há aqueles que não comem legumes, outros que não gostam de feijão, os que querem brincar com os alimentos... A questão é tão universal quanto a brincadeira com as "garfadas-veículo". O escritor Ilan Brenman criou várias garfadas - as esportivas, as animais, as aeronáuticas e as fantásticas - para animar as crianças e ajudar os pobres pais. Conheça todas elas, em um livro recheado de boas ideias para refeições bem mais divertidas!

POSSIBILIDADES DO DESENHO PARA ALÉM DO LÁPIS E PAPEL


O lápis de cor e o papel são os materiais mais tradicionais entre as crianças, presentes em todas as unidades de educação infantil. É possível desenhar sem lápis e papel? Um desenho e uma linha, pensados além da maneira tradicional de desenhar, rompem com a ideia de que a produção artística deve ser apenas observada. O desenho entra em contato com o corpo: corpo de quem produz, de quem vivencia o desenho. As linhas passam a existir também em outros espaços e criam novos ambientes.
Esta maneira de pensar o desenho propõe a interação das crianças e adultos com o trabalho desenvolvido pelos pequenos. Pensar sobre a relação do desenho com o espaço e as diversas possibilidades de construí-lo pode aproximar a produção infantil da arte contemporânea por meio do processo vivido. Ao ampliarmos nosso olhar para o que pode ser considerado desenho na arte contemporânea, encontramos uma diversa gama de possibilidades para o que pode ser chamado de “linha desenhada”, desta maneira, vamos conhecer o trabalho da professora Gabriela Maria Telo, da EMEI Parque Cocaia II, que caminha inspirado nesse pensamento. Ela propõe às crianças de seu grupo uma pesquisa de linhas que não são as riscadas no papel e suas relações com os espaços. Com o objetivo de pesquisar a linha matérica e transformar o espaço do desenho, a professora ofereceu ao grupo de crianças alguns rolos de barbantes.
Iniciou a proposta com uma roda de conversa sobre a atividade que seria desenvolvida, explicou para a turma que fariam desenhos sem utilizar lápis, canetinhas, tinta ou qualquer outro material riscante. Colocou ainda para seus aprendizes que o espaço organizado para este trabalho seria a sala de aula.
Para o primeiro momento desta proposta, foi planejado criar um desenho único pelo espaço com o envolvimento de todo o grupo. A professora, então, perguntou para as crianças como poderiam concretizar esta ideia e várias sugestões surgiram: “É só colocar o barbante no chão e fazer o desenho com ele” – diz uma criança -, “a gente pode ficar segurando”.
Outra criança sugeriu o desenho de um grande foguete pelo espaço. Os alunos gostaram desta ideia e a partir das sugestões dadas pelo grupo foram desenhando juntos, imaginando, expressando movimento no ar.
Em seguida, a professora dividiu a turma em pequenos grupos e ofereceu pedaços de barbante para cada participante. O desafio, agora, seria criar outros tantos desenhos pelo espaço com esses pedaços de linha. A partir desse momento, a sala de aula transformou-se em um território lúdico habitado pelos desenhos das crianças.
Interessante notarmos como essa proposta foi capaz de promover a pesquisa das espacialidades, transformar ludicamente o espaço além de alimentar a criatividade e curiosidade infantis. Considerando que a sensibilidade visual pressupõe a percepção do espaço, nesta proposta as crianças foram autoras desse “espaço desenhado”, relacionando a linha com a  arquitetura e os objetos tridimensionais que ocupavam a sala.
A proposta de trabalho com a linha matérica foi [apresentada aos professores no curso sobre Percursos Criativos do Desenho. Flávia, professora da EMEI Antônio Gonçalves Dias, ficou curiosa com a discussão promovida em seu grupo e levou a ideia para a sua escola. Ela nos conta: “Propus que brincássemos com linhas de barbantes e de lãs. Ao brincar com as linhas, ao explorar o material, as crianças perceberam que poderiam criar desenhos sem usar os lápis e acharam muito divertido, logo se envolveram no jogo de desenhar. Manuseando-as sobre a mesa, organizaram desenhos de vários objetos. Organizando e reorganizando, elas iam desmanchando e contornando outros objetos, se deliciando ao perceber que poderiam criar com sua imaginação inúmeras figuras. Em outro dia, sugeri que brincássemos com o barbante espalhando-o pelo espaço, podendo criar construções tridimensionais, como por exemplo: cabanas, casinhas, labirintos, etc.” O exemplo da professora Flávia mostra como é possível às crianças transformar o espaço com o desenho,  explorando a linha matérica.
Por meio do uso de materiais cotidianos como o barbante, as cadeiras e a arquitetura da sala de aula a professora organizou os materiais e os espaços como estratégia para sensibilizar o grupo de aprendizes para esta nova maneira de perceber o desenho e desenhar.
O que foi planejado pela professora teve o foco no processo do trabalho, desta maneira, além de aproximar a produção das crianças com os processos criativos propostos na atualidade,
legitimou a marca da produção infantil ao proporcionar um olhar sensível para os desenhos produzidos pelo grupo, que expandiram seus gestos para fora dos limites do papel.


“Desenhar é várias coisas.
É lançar a linha no espaço, anarquicamente, mas com aquela
ordem interna que só quem faz sabe.
É estabelecer um continente, que aparentemente
não contém nada, mas onde pode caber tudo
(e onde cabe o vazio que é nada e tudo ao mesmo tempo).
É criar relações entre coisas, dando pesos e valores.
É falar de objetos e fazê-los falar.
E finalmente é lançar um olhar para a realidade, procurando e
achando significados.”
Ester Grinspum

* Texto de: Sheila Christina Ortega

    

segunda-feira, 25 de junho de 2012

PERCURSO CRIATIVO NO DESENHO





PERCURSO CRIATIVO NO DESENHO
Silvana Augusto

O desenho, ao contrário do que muitos pensam, nem sempre é figurativo. O desenho de figuras, tão valorizado pelos adultos, é fruto de um processo intenso de exploração e de muita pesquisa tanto gestual quanto visual.
Quando bem pequenas, as crianças ainda não têm desenvolvido a noção de permanência do objeto. Para um bebê, os objetos não existem separadamente, não existem senão quando está diante dele, em um dado momento. Isto, que é uma característica própria do desenvolvimento infantil, não representa uma limitação. Vale lembrar que os primeiros anos da vida de uma criança encerram uma fase de grande desenvolvimento motor, importante para a construção das condições necessárias ao domínio do conhecimento do mundo simbólico e a aprendizagem das linguagens.
Nessa fase da vida é a inteligência sensório motora que ganha espaço nas experiências infantis. Então, pintar ou mesmo rabiscar são, para a criança pequena, puro fazer, prazer do movimento.
Para a criança pequena, não está em jogo a representação, o desenho propriamente dito, importa apenas o prazer de brincar com seu próprio corpo e interagir com os materiais, seus pares e o adulto que é sua principal referência no CEI. Por isso a pintura é tão significativa para os menores. A plasticidade do material é um convite para o fazer mais próprio da faixa etária. O percurso desta linguagem começa muito cedo e pode ser alimentado no CEI, durante os anos que marcam a passagem da criança na instituição.
Os gestos estão fortemente presentes na pintura infantil, mas também aparecem na produção gráfica, apontando para um percurso bem diferente. O gesto também aparece marcando a superfície desde os primeiros rabiscos da criança. O desenho propriamente dito aparecerá no percurso infantil um pouco mais tarde e, contrariando o que muitos educadores costumam pensar, não é intencional desde o início. Ao desenhar, a criança brinca: na maioria das vezes, sobretudo quando é pequena, não sabe ao certo o resultado desta ação, mas isso não importa, pois é o convite parabrincar com os meios (tinta, giz de cera, carvão etc.), materiais (pincéis, rolinhos, esponjas etc.) e suportes (papel, papelão, chão, parede etc.) que realmente lhe interessam. A brincadeira pode resultar em uma figura ou não.
Ao brincar desenhando ou desenhar brincando, a criança vai descobrindo novos prazeres e desafios dessa experiência, novas formas de se relacionar com o mundo. À medida que as crianças adquirem domínio sobre seu corpo e os movimentos que ele produz, vão conquistando a condição de atuar sobre a plasticidade da matéria. Logo percebem que seus gestos produzem marcas estáveis. E então, aquilo que já fora puro fazer, gesto no espaço, um movimento tão característico das crianças até 2 anos, vai se constituindo como um desenho.

domingo, 24 de junho de 2012

MODOS DE OLHAR O DESENHO NA EDUCAÇÃO INFANTIL




Modos de olhar o desenho na  Educação Infantil
Sheila Christina Ortega e Cinthia S. Manzano

 O desenho é uma das linguagens mais associadas às atividades infantis e tradicionalmente está presente na educação infantil. Muitos são os estudos sobre o desenho da criança, com diferentes abordagens: há, por exemplo, uma tendência pedagógica que relaciona a produção infantil à expressão dos sentimentos, das emoções e dramas internos das crianças. 
Os estudos que embasam esse modo de olhar o desenho têm sido úteis à análise psicológica, quando feita por especialistas clínicos. Não é esse o caso da escola. Como, então, podemos olhar o desenho da criança na educação infantil?
Podemos considerar o ato de desenhar como a marca de uma trajetória. O desenho pode ser o registro de um movimento que aconteceu num pedaço de papel, um risco no muro, o caminho percorrido por um veículo ou o percurso que o nosso corpo desenvolve no espaço enquanto nos movimentamos. Pode ser uma brincadeira visual repleta de sentidos. 
É interessante pensar que por meio do desenho imprimimos nossa marca e delineamos nossa individualidade. Desse ponto de vista, o desenho pode ser visto como marcas, registros, vestígios. Mas não só isso. Desenhar é também uma forma de se aproximar das linguagens artísticas. Produzir arte implica em olhar para o mundo de maneira curiosa, fazer perguntas, procurar formas de entender os acontecimentos e estabelecer relações. Na educação infantil, as crianças não produzem arte o tempo todo, mas as experiências que elas tem com a linguagem do desenho as envolvem em um intenso processo de imaginação e criação. Esse processo está ligado ao desenvolvimento da sensibilidade estética, do fazer artístico e da construção de narrativas.  

Toda criança desenha


Tendo um instrumento que deixe uma marca: a varinha na areia, a pedra na terra, o caco de tijolo no cimento, o carvão nos muros e calçadas, o lápis, o pincel com tinta no papel, a criança brincando vai deixando sua marca, criando jogos, contando histórias.
Desenhando cria em torno de si um espaço de jogo, silencioso e concentrado ou ruidoso seguido de comentários e canções, mas sempre um espaço de criação lúdico.
A criança desenha para brincar [...].[...] Entendendo por desenho o traço no papel ou em qualquer superfície, mas também a maneira como a criança concebe seu espaço de jogo com os materiais de que dispõe.


[...] O que é preciso considerar diante de uma criança que desenha, é aquilo que ela pretende fazer: contar-nos uma história e nada menor do que uma história. Mas devemos também reconhecer, nessa intenção, os múltiplos caminhos de que ela se serve para exprimir aos outros a marcha dos seus desejos, de seus conflitos e receios. Porque o desenho é para a criança uma linguagem como o gesto ou a fala.A criança desenha para falar e poder registrar sua fala.
Para escrever.(Ana Angélica Albano Moreira – O espaço do desenho: a educação do educador. Ed. Loyola, 1995. Cap. 1 “O desenho da criança”.)


A atividade de desenhar também pode ser vista como uma forma de criar limites, sejam eles reais ou imaginários. Atividade que permite construir novas estruturas no espaço, inventá-los. Cada criança possui diferenças individuais ao organizar seu espaço de brincadeira e construir seus desenhos. A criança desenha para brincar e, ao fazer isso cria ao seu redor um espaço de jogo. Por isso, podemos dizer que é desenho até mesmo o modo como a criança organiza seus brinquedos, por onde andam seus carrinhos e como organiza os gravetos e folhas ao brincar no parque. Quando proporcionamos bons espaços e boas oportunidades para a criança brincar enquanto desenha, a criação e a expressão acontecem globalmente: o corpo participa da criação. E é também nesse sentido que se pode entender o desenho como movimentação e atitude infantis uma vez que o gesto, ao tornar-se exercício para a individualidade, apreende desenho também como atitude.
Se dermos às crianças a mesma liberdade no processo artístico que lhes damos em suas brincadeiras, as crianças chegarão a excelência no aprimoramento do processo criativo. A
Em todos esses casos, é importante ao planejamento da educação infantil garantir que a criança possa escolher como se expressar. O adulto precisa estar atento, percebendo seus sinais não para direcionar ou adequar o desenho da criança a uma norma ou padrão estético, mas sim para alimentar o processo de investigação artístico que é tão caro às crianças. Dessas investigações e descobertas é que nascem as interações, um processo dinâmico que proporciona o desenvolvimento da linguagem artística e o cultivo da curiosidade infantil.
No trabalho educativo de crianças pequenas, é muito importante que o professor crie contextos para a exploração dos processos ligados à produção artística. Nesse sentido, pode organizar propostas de atividades que despertem a curiosidade das crianças e o olhar investigativo sobre diferentes aspectos da vida cotidiana: como posso expressar o que sinto, o que desejo, como vejo e me relaciono com o outro, uma ideia etc.


* fonte: http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Projetos/BibliPed/Documentos/Publicacoes/Cad_Rede/cinco%20atualizados/Desenho_grafica.pdf