O lápis de cor e o papel são os
materiais mais tradicionais entre as crianças, presentes em todas as unidades
de educação infantil. É possível desenhar sem lápis e papel? Um desenho e uma
linha, pensados além da maneira tradicional de desenhar, rompem com a ideia de
que a produção artística deve ser apenas observada. O desenho entra em contato
com o corpo: corpo de quem produz, de quem vivencia o desenho. As linhas passam
a existir também em outros espaços e criam novos ambientes.
Esta maneira de pensar o desenho
propõe a interação das crianças e adultos com o trabalho desenvolvido pelos
pequenos. Pensar sobre a relação do desenho com o espaço e as diversas
possibilidades de construí-lo pode aproximar a produção infantil da arte
contemporânea por meio do processo vivido. Ao ampliarmos nosso olhar para o que
pode ser considerado desenho na arte contemporânea, encontramos uma diversa gama
de possibilidades para o que pode ser chamado de “linha desenhada”, desta
maneira, vamos conhecer o trabalho da professora Gabriela Maria Telo, da EMEI
Parque Cocaia II, que caminha inspirado nesse pensamento. Ela propõe às
crianças de seu grupo uma pesquisa de linhas que não são as riscadas no papel e
suas relações com os espaços. Com o objetivo de pesquisar a linha matérica e
transformar o espaço do desenho, a professora ofereceu ao grupo de crianças
alguns rolos de barbantes.
Iniciou a proposta com uma roda
de conversa sobre a atividade que seria desenvolvida, explicou para a turma que
fariam desenhos sem utilizar lápis, canetinhas, tinta ou qualquer outro
material riscante. Colocou ainda para seus aprendizes que o espaço organizado
para este trabalho seria a sala de aula.
Para o primeiro momento desta
proposta, foi planejado criar um desenho único pelo espaço com o envolvimento
de todo o grupo. A professora, então, perguntou para as crianças como poderiam
concretizar esta ideia e várias sugestões surgiram: “É só colocar o barbante no
chão e fazer o desenho com ele” – diz uma criança -, “a gente pode ficar
segurando”.
Outra criança sugeriu o desenho
de um grande foguete pelo espaço. Os alunos gostaram desta ideia e a partir das
sugestões dadas pelo grupo foram desenhando juntos, imaginando, expressando
movimento no ar.
Em seguida, a professora dividiu
a turma em pequenos grupos e ofereceu pedaços de barbante para cada
participante. O desafio, agora, seria criar outros tantos desenhos pelo espaço
com esses pedaços de linha. A partir desse momento, a sala de aula
transformou-se em um território lúdico habitado pelos desenhos das crianças.
Interessante notarmos como essa
proposta foi capaz de promover a pesquisa das espacialidades, transformar
ludicamente o espaço além de alimentar a criatividade e curiosidade infantis.
Considerando que a sensibilidade visual pressupõe a percepção do espaço, nesta
proposta as crianças foram autoras desse “espaço desenhado”, relacionando a
linha com a arquitetura e os objetos
tridimensionais que ocupavam a sala.
A proposta de trabalho com a
linha matérica foi [apresentada aos professores no curso sobre Percursos
Criativos do Desenho. Flávia, professora da EMEI Antônio Gonçalves Dias, ficou curiosa
com a discussão promovida em seu grupo e levou a ideia para a sua escola. Ela
nos conta: “Propus que brincássemos com linhas de barbantes e de lãs. Ao
brincar com as linhas, ao explorar o material, as crianças perceberam que
poderiam criar desenhos sem usar os lápis e acharam muito divertido, logo se
envolveram no jogo de desenhar. Manuseando-as sobre a mesa, organizaram desenhos
de vários objetos. Organizando e reorganizando, elas iam desmanchando e
contornando outros objetos, se deliciando ao perceber que poderiam criar com
sua imaginação inúmeras figuras. Em outro dia, sugeri que brincássemos com o barbante
espalhando-o pelo espaço, podendo criar construções tridimensionais, como por
exemplo: cabanas, casinhas, labirintos, etc.” O exemplo da professora Flávia
mostra como é possível às crianças transformar o espaço com o desenho, explorando a linha matérica.
Por meio do uso de materiais
cotidianos como o barbante, as cadeiras e a arquitetura da sala de aula a
professora organizou os materiais e os espaços como estratégia para
sensibilizar o grupo de aprendizes para esta nova maneira de perceber o desenho
e desenhar.
O que foi planejado pela
professora teve o foco no processo do trabalho, desta maneira, além de
aproximar a produção das crianças com os processos criativos propostos na
atualidade,
legitimou a marca da produção
infantil ao proporcionar um olhar sensível para os desenhos produzidos pelo
grupo, que expandiram seus gestos para fora dos limites do papel.
“Desenhar é várias coisas.
É lançar a linha no
espaço, anarquicamente, mas com aquela
ordem interna que só quem
faz sabe.
É estabelecer um
continente, que aparentemente
não contém nada, mas onde
pode caber tudo
(e onde cabe o vazio que é
nada e tudo ao mesmo tempo).
É criar relações entre
coisas, dando pesos e valores.
É falar de objetos e
fazê-los falar.
E finalmente é lançar um
olhar para a realidade, procurando e
achando significados.”
Ester
Grinspum
* Texto de: Sheila Christina Ortega
Um comentário:
Oi Priscila, améi suas postagens, cada vez com conteúdos informativos e ricos em conhecimentos. Parabéns!! Uma linda noite e um final de semana abençoado. Bjuss
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