terça-feira, 7 de agosto de 2012

ERA UMA VEZ UM PANO QUE NÃO QUERIA SER PANO



A EXPLORAÇÃO DE OBJETOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Marina Marcondes Machado



Você sabia que … o modo animista de olhar o mundo é a chave de todo o teatro de animação, bem como elemento fundamental em diferentes artes, incluindo desenhos animados e cinema?
Na formação de professores em 2010, o experimento apelidado por nós “Era uma vez um pano que não queria ser pano” foi, das quatro experiências propostas no curso “Práticas teatrais junto a crianças de zero a seis anos”, o mais bem sucedido. Foi proposto para professores de CEI e EMEI que realizassem o seguinte experimento teatral:


Primeiro experimento (Materiais)
Descrição: Pegue um pedaço de pano, que poderá ser uma fralda ou uma toalha, desde que não tenha desenhos ou imagens figurativas. Explore pela movimentação as possibilidades de transformar o pano em outros objetos.
Como eu faço: Dobrando, amassando, esticando, prendendo no corpo... e essas ações transformarão o pano em outros objetos, tudo menos toalha ou fralda.

Para CEI:  Esta proposta será desenvolvida pelo professor narrador, que poderá criar uma história que propõe a transformação do pano. Outra possibilidade é de exploração desta transformação com o apoio de uma música como trilha sonora, que promova diferentes movimentos e, consequentemente, novos modos para o pano.
No decorrer deste experimento por parte do professor, observe a reação das crianças. Terminada a ação do adulto, ofereça um pano para cada criança explorar, e registre as formas pelas quais ela movimentou o pano. Não dê qualquer orientação para as crianças, mesmo que o movimento delas não vá para a direção esperada.

Para EMEI: Para as crianças de EMEI, ofereça um pano para cada uma e explore a movimentação dos mesmos. Crie, junto com as crianças, uma narrativa da transformação do pano.
Esta história narrada pela professora junto com os alunos será acompanhada pela movimentação e novas ideias das crianças.

A expectativa dos formadores era de que, até o final do curso: a professora percebesse que algumas brincadeiras, especialmente as de faz de conta, são passíveis de se chamarem “teatro”; que ela não precisa esperar um “jeito certo” de realizar a atividade teatral proposta – uma vez que o pano poderia virar qualquer coisa - que a brincadeira seria vista como um desvio de percurso, ou seja, que as professoras compreendessem a íntima relação entre faz de conta e prática teatral; e que a hipótese de dar vida a um pedaço de pano fosse uma forma de aproximação com a linguagem, sentimento e pensamento infantis. É a isso que a Psicologia chama animismo.
Agora, a partir também do registro em fotografias das crianças do B II fazendo o teatro do “pano que não queria ser pano” do CEI Jardim Shangrilá, professora Elisângela Aparecida de Freitas, vamos procurar discernir como e por que esta experiência teatral foi tão bem sucedida. Se a princípio as professoras estranham a abordagem fictícia do exercício que quer dar voz a um pano, inclusive fazendo-o não querer “ser” o que ele era – um simples pano! – quando trabalharam junto às crianças, perceberam sua adesão imediata. Do nosso ponto de vista a adesão imediata se dá pelo inusitado do jogo, bem como por uma espécie de animismo que o pensamento sincrético e polimorfo da criança pequena revela.
Quem sabe cada criança pequena já se sentiu, ela mesma,“tudo menos uma criança pequena”? Isso também dá significação para a alegria dos rostos e da viva corporalidade de cada um nas imagens fotográficas, e poderíamos então dizer que as crianças identificam-se com o pedaço de pano: no momento do exercício, algo próprio da criança se presentifica no pano. Uma professora fez o experimento com folhas de papel sulfite:

“Era uma vez um papel que não queria ser papel… ele estava triste…”, e entregou uma folha para cada um; a criança, ao fazer uma pequena dobradura, que seria de um passarinho, pergunta para sua professora:
“Agora o papel está mais feliz?” Nesta condução, a professora no papel de narradora “deu emoções” para o papel; pensamos que melhor seria que o papel ou o pano “quisessem” e “precisassem” se transformar: simples assim. E que as emoções surgissem das interpretações das crianças para como e por que um pano não quer ser pano.
Nesse sentido a palavra-chave deste exercício é transformação. Elementos conjugados de transformação e animismo fazem desta aula de iniciação às práticas teatrais um grande sucesso junto a crianças de zero a seis anos.

“O animismo não é algo que desapareça com a idade”
(…) Falar de animismo é falar de afetividade, pois o
animismo é um laço (afetivo) que se cria entre
o homem e o mundo. Tal laço não desaparece com a
idade e é ele que possibilita que o imaginário de cada
um se construa.
(…) Pelo animismo o mundo transforma-se,
ou melhor, é outro desde o início, pois o animismo
guia-se pela afetividade e esta “não pensa o ser
como objeto, vive-o”.

(…) Só quando o educador se ventura no caminho
do imaginário, quando o reconhece como sendo
diferente do da objetividade científica, do da
percepção e ainda do dos conceitos do senso
comum, quando se dispõe a ler e a falar a
linguagem que lá se fala, que é essencialmente
afetiva, quando deixa que as imagens que o habitam,
procurem, afastem, abracem, destruam outras imagens,
isto é, se mantenham vivas, só então o educador
habitará o espaço da ilusão e acreditará no
Fantoche – um dos seus habitantes –
COMO ALGUÉM.”
In O Fantoche Que Ajuda a Crescer
Isabel Alves Costa & Felipa Baganha



Para que as crianças possam viver experiências de “ser”, “imaginar”, “criar”, é preciso que seus professores priorizem isto. Um trabalho assim só pode se desenvolver se o professor for alguém profundamente interessado em compreender como as crianças pensam, o que elas dizem, o que fazem, como brincam e os temas que surgem em seu
repertório lúdico. (Orientações Curriculares: Expectativas de aprendizagens e Orientações didáticas para Educação Infantil/ SME-DOT-EI,São Paulo, 2007. p.128)


3 comentários:

Unknown disse...

Muito interessante este post. Adoro trabalhar assim. A gente aprende junto com os pequenos. Gostei muito do espaço e com certeza retornarei aqui mais vezes. Gostaria de convidá-la para postar esse trabalho lá no blog Educação em Foco. É um blog coletivo onde procuramos informar, aprender e compartilhar. Toda terça temos o post de um leitor ou de um amigo. Creio que seria muito interessante termos sua participação lá. Este assunto deve ser levantado sempre em nossas escolas.

=) Bom aqui está o link para conheceres o blog: http://redeeducacaoemfoco.blogspot.com.br/

E este é o e-mail para o envio do post se aceitares o convite. Saibas que serás muito bem vinda!

redeeducacaoemfoco@gmail.com

Josandra Rupf disse...

Olá querida!
Seu Blog é maravilhoso.
Sabemos que ser educador é um sacerdócio,e isto é para poucos.
PARABÉNS E Obrigada!!!

Unknown disse...

Olá Educadora Priscila, estou aqui para conhecer um pouco do seu trabalho/blog. Vejo que sua missão é uma das mais gratificantes, promover o conhecimento. É verdade que ganhamos pouco, mas somos recompensados de outros prazeres da profissão.
Educadora, permita-me deixar um link de um projeto para unir ainda mais o nosso trabalho/prazer, o blog. Trata-se de um espaço que divulga outros blogs ligados diretamente à educação, o Educadores Multiplicadores. (A parceria é justa, sincera e dinâmica). Venha fazer parte desta Família e torne-se um Multiplicador(a)!

Quando tiver um tempinho e caso queira mais informações leio o texto no link abaixo:

http://www.educadoresmultiplicadores.com.br/2012/06/seja-um-educador-multiplicador-divulgue.html

http://www.marquecomx.com.br/

Abraços sinceros, fiquemos na Paz de Deus e até breve.